«A Igreja Católica pertence à identidade de Macau».
De regresso ao território, onde teve a oportunidade de se encontrar com o bispo D. Stephen Lee, o último governador de Macau, general Vasco Rocha Vieira, mostrou-se impressionado com o novo campus da Universidade de São José. Em entrevista exclusiva a’O CLARIM, falou sobre o papel da China, da comunidade portuguesa e da Igreja Católica na RAEM.
O CLARIM – Senhor general, pode dizer-nos qual foi a sua motivação para a criação do Instituto Inter-Universitário [actual Universidade de São José] em 1996?
VASCO ROCHA VIEIRA – A ideia de criar uma universidade católica em Macau é o exemplo de que diferentes etnias e religiões podem coexistir, viver em paz e formar uma sociedade harmoniosa. Portanto, a presença do Instituto Inter-Universitário é importante e serve como exemplo de harmonia e coordenação. Ou seja, é uma ponte para melhor nos entendermos uns aos outros. Além disso, propicia uma situação em que ambas as partes ficam a ganhar, tanto Macau, como Portugal. Macau tem o melhor ambiente para absorver os benefícios de uma universidade católica, ao nível de conhecimentos, experiência, tradição, conexão mundial e reputação, entre outras. Oferece muitos aspectos únicos, relações e cooperação que não se encontram noutras universidades locais.
CL – Quem ajudou a dinamizar e a criar a Universidade?
V.R.V. – A diocese de Macau tinha há muito tempo a ideia de disponibilizar a educação terciária, com meios de pesquisas académicos e seminários para educar as pessoas em Macau e no mundo. Ainda me lembro que durante as reuniões com o bispo Domingos Lam ele tinha a ideia de criar uma universidade não apenas para ensinar Teologia e para a formação específica de missionários. A universidade católica deve estar aberta ao público para a realização académica, tal como outras universidades. Naquele tempo, quando o cardeal D. José da Cruz Policarpo veio a Macau lembro-me que disse: «Penso que uma universidade católica em Macau poderia apoiar a boa-vontade de oferecer uma universidade diferente e única». Nos anos noventa existia apenas uma universidade em Macau [a UMAC]. É fantástico haver mais laços de cooperação, juntando as culturas portuguesa e chinesa.
CL – Teve já a oportunidade de visitar o novo campus da Universidade de São José. O que lhe pareceu?
V.R.V. – Estou bastante impressionado com o campus pela forma como planearam e acomodaram tantos equipamentos num pequeno pedaço de terra. O espaço está organizado de forma bastante inteligente. O ambiente é colorido. Acredito que os estudantes vão ficar felizes por terem lá aulas.
CL – Como vê a sociedade e a diocese de Macau?
V.R.V. – Estou bastante satisfeito em saber que Macau é [uma terra] próspera. As condições de vida melhoraram bastante. Podemos encontrar hotéis de nível mundial. Sinto que as pessoas estão satisfeitas por viverem em Macau. Quanto à Diocese, sempre desempenhou um papel importante. O papel da Igreja Católica é importante, porque a Igreja pertence à identidade de Macau. Sem a comunidade portuguesa, Macau seria um lugar completamente diferente; sem a presença da Igreja, Macau também seria completamente diferente. Por exemplo, a diocese de Macau tem desempenhado um papel muito importante na educação, desde as escolas primárias até às secundárias, geridas por padres e por várias congregações. Não levam as pessoas deliberadamente a seguir o Sacerdócio, mas prestam um serviço à comunidade, ajudando-as a diferenciar o bem do mal. Abarcam também muito bem o trabalho social.
CL – E como define o papel dos principais actores da sociedade?
V.R.V. – A China desempenha um papel, a comunidade portuguesa desempenha outro papel e a Igreja desempenha outro papel. Em conjunto, tornaram Macau num local diferente, com uma identidade única num lugar pequeno, o que é revelador das possibilidades de se viver em harmonia. Há aqui tantas nacionalidades. Há pessoas de diferentes religiões, grupos, etnias e países de origem. No entanto, todos se respeitam e não querem impor as suas ideias aos outros. E isso também é importante pela forma como Macau pode ser administrada.
CL – Será que as autoridades competentes respeitam a promessa da transferência de poderes?
V.R.V. – Sim, estão a cumprir com a promessa de acordo com o compromisso assumido. As autoridades de Macau têm vindo a seguir a Declaração Conjunta e a Lei Básica, que está de acordo com a Declaração Conjunta. A população ganhou e tem confiança no futuro, porque a forma de viver em Macau permanece a mesma após a transferência de poderes para a China. Isto é muito importante porque as autoridades governam Macau de acordo com o que ficou prometido à população. Quem gosta de investir em Macau conhece claramente os regulamentos e confia nas autoridades que seguem as regras. E o Catolicismo também está bem preservado em Macau.
CL – As pessoas do território estão à procura da identidade de Macau? Qual será, no seu entender?
V.R.V. – Em síntese: preservar a harmonia, o respeito mútuo, poder viver hoje de forma pacífica e preservar a sua própria cultura, que é uma mistura do Ocidente e do Oriente, ou seja da cultura portuguesa e da chinesa, do valor cristão e de outros valores.
BENEDICT KEITH IP
com PEDRO DANIEL OLIVEIRA